“Para com isso, Pedro! Você ainda vai fazer
estrago.”
Dizem que mãe sabe tudo. A minha ia além.
Predizia desgraças
O vidro da janela da sala desabou sob o
impacto de um tiro não muito certeiro. O alvo era o Ulisses. Maldito gato!
Pra me safar de beliscões e do puxão de
orelha, me refugiei no banheiro com a arma do crime. Tranquei a porta, guardei
o estilingue no bolso da calça e sentei encolhido de medo, sobre a tampa da
privada. Imóvel, mudo, aguardei as consequências.
“Pedro, que foi isso?”
E lá estava ela, esmurrando a porta.
“Abra essa porta, moleque! Se demorar, vai
ser pior.”
Preferi apostar no pior.
“Você vai ver quando seu avô chegar!”
Preferi esperar pra ver. “Homem com homem se
entende”, pensei.
Minha mãe era de acessos. Filha única,
enviuvara cedo.
Logo ouvi passos se afastando, descendo as
escadas e depois... apenas o silêncio de uma cela solitária.
Me dei conta que a espera seria longa.
Acabara de almoçar e meu avô voltaria do trabalho apenas no final da tarde.
Minha bunda começou a ficar fria, minhas
costas a doerem. Experimentei a privada com a tampa levantada. Depois o bidê.
Sentei no chão encostado na porta do box sobre o tapetinho de crochê. Por fim,
me estiquei na banheira.
Era de louça branca, com uma reentrância para
acomodar a cabeça. Foi o que fiz. Me dei por morto. Afinal, a tarde estava
perdida.
Antes do último suspiro, uma visão. Uma mosquinha
cega, dessas que nascem para a eternidade nos banheiros, colada na imensa
parede de azulejos azuis, bem próxima do meu rosto.
Era menos que uma caca de nariz. Não servia
pra nada. Pensei assoprá-la. Como pressentindo, voou em direção à porta e ousou
posar sobre uma peça de roupa ali esquecida.
Um sutiã. De renda vermelha.
Desviei o olhar, mas minha atenção fora
enfeitiçada.
Eu tinha doze anos e estava só.
Seios começaram a preencher e se despir
daquele sutiã ao ritmo desordenado de lembranças e devaneios. Seios vistos,
pressentidos, imaginados, queridos. Os seios da minha mãe, da minha avó, de
tias, primas, professoras, de todas as mulheres. Seios pequenos, grandes,
fartos, murchos, arrojados, envergonhados. Seios brotando, maduros, em flor.
Seios negros, mulatos, seios beijados, mordidos, lambidos, deleitados,
sorvidos. De mamilos rijos, róseos, da cor do carmim, escarlates, a jorrar
leite e prazer.
Um fluxo de desejo agitou meu sangue. A
correr desordenado, acelerou as batidas do meu coração e retesou, robusteceu,
fez crescer parte do meu corpo. Isso nunca tinha acontecido.
De um salto, levantei.
No espelho que cobria a parede, me vi
projetado, macho da minha espécie.
Ainda confuso, mas já poderoso, esmaguei com
a palma da mão a mosquinha cega.
Eu fora expulso do paraíso.
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