Valentina vivia um casamento infeliz de há muito tempo.
Naquele vigésimo quarto ano, decidiu não comemorar as Bodas de Prata. Deu um basta ao conselho da avó que, em última instância, chegou à sentença final. “Ruim com ele, pior sem ele”.
Por conseguinte, se submeteu a Freud, frequentou workshops xamânicos, se banhou em cachoeiras indígenas e tatuou uma palavra védica atrás da orelha. “Um bom lugar para escondê-la, para que nem meu esposo nem meu filho vejam”, Valentina se justificou com o terapeuta.
Com uma herança de crendices incutidas pela mãe, que lhe repetia casos extraordinários, acreditava em tudo diante do mistério da vida, no inexplicável de tantos acontecimentos inimagináveis. “Há mais coisas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia”, Valentina explicou ao terapeuta.
Ao fim e ao cabo, aceitou a sugestão da Cassandra, uma amiga de infância. “Procure a cartomancia. Madame Janette viu o nascimento do meu filho antes mesmo de eu saber que estava grávida. Ela é profissional da área há dez anos, tem clientes até nos Estados Unidos e no resto do mundo, e muitos são influencers famosos.”
Na tarde daquela fria sexta-feira de julho, Valentina foi consultá-la. Ao entrar no quarto rodeado de cortinas escuras cobrindo as janelas, ela procurava respostas que aliviassem a frustração presente e a ansiedade em saber o que a vida lhe reservava, mesmo temendo o desconhecido.
Madame Janette era uma mulher de cinquenta anos, nariz e sotaque eurasianos, olhos verdes-esmeraldas com uma aura de escuridão e astúcia.
Convidou Valentina para sentar e sentou-se do lado oposto da sua mesa de trabalho posicionada no centro da sala, coberta por uma toalha vermelha com símbolos místicos, onde estavam expostos cristais, velas acesas, incensos de limpeza e proteção. Abriu uma gaveta e tirou um baralho.
Com o coração vibrando como uma britadeira, Valentina não desgrudava os olhos de Madame Janette, ansiosa pelo que viria.
A cartomante começou a baralhar as cartas, baralhou-as bem, dividiu-as em três maços que transpôs três vezes, combinou-os, começou a estender as cartas viradas para baixo em formato de leque e pediu que Valentina escolhesse uma. Repetiu três vezes esse ritual e Valentina escolheu uma carta a cada uma dessas três vezes. A sorte fora lançada.
“As cartas me dizem que você não precisa ter medo. Sua gravidez será gemelar de meninas.”
Como daí a Valentina chegou ou não às Bodas de Prata eu não soube nunca.
Perdi contato com a Cassandra quando fui trabalhar na sucursal de Roma em agosto.
LIC