O
amor impede a morte! Sei
o que estou dizendo quando escrevo isso: já perdi seres queridos, muitos, que
estão vivos porque eu os amo.
Mas a
morte continua sendo um mistério. Minha compreensão sobre isso, e sobre tantos outros
mistérios, é limitada. Nem o instinto ou a intuição me ajudam a conviver em paz
com eles.
Tem dias
que ela me aterroriza, quando imagino a solidão em que deve viver um morto. Não
tenho natural predisposição para a convivência. Por vezes, sou um pouco
ausente. Porém, estar sozinha pela eternidade não me agrada. Gosto de ficar só bem
acompanhada.
Aceitando essa
minha incompreensão sobre o derradeiro destino, aceito como dever ir até o fim e
protagonizar o epílogo do livro de quem escreveu e determinou todos os meus
dias. Sim, estou falando de Deus.
Algo está
sempre por acontecer. O outono, desta vez. Ele já está à espreita, em suspenso
no amanhecer lento, no vento fresco ao anoitecer, com umas e outras folhas de
árvores mudando de cor e caindo. É um tempo de aceitação quase unânime porque equilibrado,
nem oito nem oitenta no frio e no calor.
Vou
interromper um pouco porque o interfone tocou. “Sim, Antônio, pode colocar no
elevador social.” Os livros chegaram. Há muito não fazia isso, comprar livros.
São itens valiosos, mas caros. Num ímpeto, comprei seis, para as noites
insones, feriados prolongados e dias santos. Por incrível que pareça, tem santo
para todos os dias, de santa Adelaide a santa Zita. Enfim... são 2.000 anos de
Cristianismo. Não tem com K e com Y na língua portuguesa. Em outro idioma, talvez
tenha.
Estou
estudando inglês. Tenho motivos para isso: amo esse idioma e quero melhorar
minha saúde cognitiva. Quem entende do nosso cérebro sugere que ser
bilíngue na idade adulta pode ajudar a evitar a demência. Deus do céu, é o que
desejo!
A
propósito, me lembrei agora das senhorinhas que vivem naquele casarão de dois
andares. Pele rugosa, flácida, cabelos brancos, andar lento são alguns sinais
que denunciam sua idade – 80, 90, dona Hipólita com 102 anos – e a demência. Elas
vivem na zona cinzenta do esquecimento, com flashes emaranhados do passado, num
tempo que é agora, mas se desvanece no instante imediato.
Por quê, meu Deus, por quê? É mais um daqueles mistérios que não compreendo. Nem compreenderam os homens no passado.
Um deles, meditando sobre a vida e a condição
humana, escreveu: “Somos breves como o sono, como a relva que brota com a
alvorada, germina e floresce pela manhã, mas, ao pôr do sol, murcha e seca”.
Só o amor
impede a morte!
O dia está
ameno. Vou visitá-las hoje.
LIC
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