Todos
os anos, no final das férias de verão, a ladainha era a mesma.
“Você
não fica com vergonha dos seus filhos voltarem para casa com saudade da comida
da empregada”?
Pois
eu não ficava e fazia coro com eles, sem vergonha. “Dona Vera, que saudade do
seu arroz e feijão!”
Na
casa dos meus pais, era minha mãe que cozinhava, desde sempre e foi para todo o
sempre.
Em
meia hora, o almoço estava pronto; quarenta minutos no máximo às
quintas-feiras, quando era dia de macarrão ao alho e óleo, bife à milanesa e
salada de brócolis.
Não
que ela gostasse de cozinhar. Não gostava. Ela amava costurar.
Mas
foi uma das obrigações que, presumida e assumidamente, se aceitava com o
casamento naqueles tempos.
Nem
sei se isso já tinha mudado no meu tempo ou se mudou nestes tempos de agora.
O
que aconteceu foi que minha sogra – que seu pouso eterno tenha sido seguro – me
deu de “presente” uma auxiliar do lar. E eu escolhi, dentre muitas candidatas,
a que aceitou a única exigência: saber cozinhar.
A
razão, motivo, justificativa, desculpa era eu trabalhar das 8h às 14h.
A
verdade é que eu não sabia cozinhar e não
herdei o consentimento da minha mãe sobre esse item do contrato.
Até
tive boa vontade e tentei seguindo o passo a passo do “Cozinhando com Ofélia”.
Mas meu primeiro jantar feito à mão foi cenário de um pesadelo na cozinha.
Foi
então que a Covid-19 chegou. E a humanidade, eu inclusive, foi obrigada a
trabalhar intensamente na mudança de hábitos, costumes e atitudes.
Dona
Vera, por opção dela, e com minha aceitação incondicional, parou de trabalhar
aqui em casa.
Sem
ela, o processo de adaptação foi penoso, tem sido intenso, e dura até hoje. Mas
não desperdicei oportunidades de transformação.
Já
sei fazer arroz “soltinho”. O segredo é não mexer durante o cozimento porque
pode liberar amido extra, deixando o arroz pegajoso.
Sei
cozinhar feijão e engrossar o caldo. É só separar uma pequena porção dos grãos
cozidos, amassá-los para liberarem amido, devolver na panela, deixar cozinhar
por mais alguns minutos, sem tampa.
Apesar
de tanto tempo passado desde a Pandemia, é só por enquanto. Pareço a humanidade
que, desde então, tem trabalhado tão pouco para se transformar.
Apesar
disso, se continuo não gostando de cozinhar, tenho analisado seriamente com o
terapeuta minha resistência profunda a essa ocupação que, dizem, é uma arte que
requer criatividade e imaginação.
Minha
mãe não gostava de cozinhar, mas usava sua criatividade e imaginação costurando.
Prefiro
usá-las escrevendo. Como Mário de Andrade, “escrevo sem pensar, tudo o que meu
inconsciente grita. Penso depois: não só para corrigir, mas para justificar o
que escrevi”.
Foi
o que fiz até este ponto final.
P.S.: Hoje, eu aprendi, e fiz, jiló refogado sem o gosto amargo. Oh glória!
LIC
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