quinta-feira, 17 de outubro de 2024

BELLA ITALIA - OTTAVO ATTO

 

A NAPOLI

Chegamos em Nápoles no dia 16 de maio, depois de uma viagem longa de 300 quilômetros.

Cruzamos Basilicata, uma região da Itália meridional que faz fronteira a oeste com a Campania, onde está Nápoles, no sul da Itália. 

Nossa chegada a Nápoles foi, mais ou menos, como chegar a São Paulo pela Marginal Tietê às 5h30 da tarde. Se, de maneira geral, i piloti italiani sono spericolati, audaci, temerari, indisciplinati, os de Nápoles são tudo isso ao cubo. O trânsito é caótico.

Nápoles é a terceira cidade mais populosa da Itália, atrás de Roma e Milão. Está cercada por montanhas e fica ao lado do famoso Monte Vesúvio. Banhada pelo mar Tirreno, Nápoles tem um intenso movimento portuário.

Me pareceu muito diferente das cidades já visitadas, recheadas de cenários antigos, retratos de séculos de histórias, algumas também cosmopolitas. Nápoles me fez lembrar da porção antiga do centro de São Paulo, a região do Brás onde minha avó morou e do Mercado Municipal.

Nosso hotel estava numa zona residencial, mais ou menos central, com muitos prédios, quase todos do mesmo tamanho, uns tão próximos dos outros que nosso horizonte era as janelas dos prédios vizinhos. As ruas sem saída, estreitas, de mão dupla, tinham carros estacionados dos dois lados das calçadas. 

À noite, fomos saborear a famosa pizza napolitana na “Pizzaria di Napoli”, uma das melhores e mais antigas da cidade. E conhecemos o centro da cidade – sujo, escuro, pichado, mal cuidado, cheio de becos, desprotegido. Nápoles não é uma cidade 100% tranquila em relação a assaltos e furtos em vias públicas. 

Mas seu centro histórico foi declarado patrimônio mundial pela Unesco. Coisas deste mundo!

Foi em Nápoles que também conhecemos a rusticidade do italiano, de forma visível, tangível e palpável. De maneira geral, é preciso tato e diplomacia no trato com o napolitano.

Siamo arrivati a Capri il giorno dopo, grazie a Dio. Isso porque saímos ilesos ao passar de táxi pela “encruzilhada da morte”, uma esquina do nosso hotel que é um entroncamento de, pelo menos, seis ruas de mão dupla que desembocam numa praça. Sem semáforo, sem preferencial, só rezando um Pai Nosso para se salvar.

A caminho do porto, passamos pela Spaccanapoli, uma rua comprida, reta e estreita que atravessa o antigo centro histórico da cidade de Nápoles, limitada para o tráfego de carros e não aconselhável para turistas. Seu nome significa "Divisor de Nápoles", pois parece dividir aquela parte da cidade.

Embarcamos no ferryboat que nos levaria a Capri, uma grande balsa com vários assentos, como um ônibus aquático, ocupado por gente de todas as tribos, raças e nações. 

Chegando nessa belíssima ilha mediterrânea montanhosa, de origem calcária, tínhamos um barco reservado à nossa espera. Por quatro horas, visitamos várias ilhas e grutas da costa, num belíssimo passeio por um mar de água azul turquesa. Recordei de cenas de vários filmes.

Optamos por não fazer o passeio in funicolare em direção ao Monte Solaro, pois poderíamos admirar os cenários espetaculares que se vê desse ponto mais alto da ilha no passeio de carro que faríamos pela Costa Amalfitana nos próximos dias. 

Abbiamo pranzato sul lungomare, passeggiato lungo il molo principale, preso un gelatino, comprei uma echarpe linda pra mim, aguardando a hora do ferryboat. 

À tardezinha, embarcamos de volta a Nápoles. A chegada ao porto me lembrou a saída de torcedores de um jogo de futebol no Estádio do Pacaembu: gente, muita gente gritando, oferecendo moto, táxi, van. 

Escolhemos ir de van. Era um pouco alta e tive dificuldade pra entrar. Horror dos horrores! Tive a impressão que, se eu demorasse mais dois minutos pra levantar a perna e subir, o motorista ia me pegar e jogar lá dentro. Apesar de sua estranheza, rudeza, seu mal humor e mudez, chegamos sãos e salvos ao hotel. Gloria a Dio, grazia, Signore, che ci ha riportato qui!

Domani andiamo a Pompei.

Texto e pesquisa: LIC 

Fonte: Maria Ana Centrone Santini

domingo, 13 de outubro de 2024

AJUSTES

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Algo sobre o que ninguém pode contestar é que o mundo precisa de ajustes. Por exemplo, ainda não caiu em desuso matar gente. E não é de agora. Caim matou Abel lá no princípio. Desde então, são irmãos que matam irmãos, já que há um único Pai Nosso para gregos e troianos. Guerras e mais guerras têm preenchido nossos dias. Apesar de períodos ocasionais de relativa paz, dizem que alusivos a 99,99% do tempo da existência do Planeta, as guerras têm sido uma constante entre nós.

Quer saber o porquê?

Leia os clássicos.

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

EXPECTATIVA

@lic

Passando por aqui...

O Sêneca disse que a expectativa é o maior impedimento para se viver. Eu acrescento, sem nenhuma pretensão filosófica, que "expectativa é igual paçoca, do nada esfarela tudo". Minhas sábias e gentis avós completariam afirmando que é contar com o ovo que está dentro da galinha. 

Não sabemos o que o amanhã nos reserva. 🤷🏻‍♀️

Diante dessa enorme incerteza, só nos resta o just enough, day by day. 

E ler os clássicos. 📚

terça-feira, 8 de outubro de 2024

BELLA ITALIA - SETIMO ATTO


DA BARI A POLIGNANO A MARE

Depois de quatro horas de viagem, em estradas margeando a costa litorânea, chegamos a Bari. O percurso de aproximadamente 385 quilômetros foi cansativo, principalmente porque convivemos novamente con la spericolatezza degli automobilisti italiani. Eles dirigem como se não tivessem amanhã. Molto stressante.

Bari é uma comune da província de Bari, na região da Apuglia.

Que emoção imensa ao chegar lá. Tudo me pareceu familiar, pois Bari tem um espaço reservado no meu coração desde quando criança eu escutava as histórias que meu pai contava dessa terra distante.

Nós nos hospedamos em um Airbnb de frente para o Adriático. A cor desse mar, de um azul intenso, me pareceu único, indescritível!

Bari é bem fácil de ser visitada a pé. Foi o que fizemos durante todo aquele único dia nessa linda cidade.

Conhecemos a “Strada delle Orecchiette”, uma rua famosa onde as mulheres baresas produzem artesanalmente a típica massa orecchiette, que tem esse nome porque lembra uma pequena orelha. Abbiamo immediatamente aggiunto questa pasta e questa focaccia al nostro menu, símbolos gastronômicos de Bari.

Almoçamos orecchiette ao sugo, proprio come i pranzi della domenica a casa di mia nonna Mariana. Lembro que, já nas proximidades da sua casa, da rua, sentíamos o perfume do molho que ela apurava desde cedo.

Em Bari, a “Conserva Centrone”, cujos produtos em conserva – azeitona, beringela, tomate seco, pimentas, pepinos, picles – são conhecidos até no Brasil, pertence a parentes distantes do meu pai. Infelizmente, não conseguimos manter contato com eles, pois a fábrica estava fechada no dia que fomos até lá.

Encerramos nossa estada no agito da noite barese, nel centro storico, na Piazza del Ferrarese, próxima ao mar, entre bares, restaurantes locais, molte persone, molti giovani, luz e som.

No dia seguinte cedo, seguimos para Polignano a Mare.

Polignano a Mare fica no calcanhar da Itália, a 36 quilômetros ao sul de Bari. Seu núcleo mais antigo fica sobre um complexo rochoso voltado para o mar Adriático.

No decorrer da nossa viagem, foi surpreendente observar a diversificada geografia física e formação geológica da Itália: uma mistura de relevo montanhoso (predominante), belíssimas regiões litorâneas, lagos, falésias e vastas planícies campesinas, como da charmosa região da Toscana. 

Muitas emoções e marcantes experiências sensoriais, que me levaram às lágrimas diversas vezes, estavam por vir.

Em Polignano a Mare, onde meus avós paternos nasceram, ho sentito fortemente la presenza di mio padre, per la passione con cui parlava sempre di questa terra che, purtroppo, non ha mai conosciuto.

Ao olhar o mar de Polignano, vi os olhos do meu neto, o Lucca, naquele azul profundo, numa tonalidade inconfundível, resultado do encontro do tom esmeralda do Mar Adriático com o azul turquesa do mar Jônico.

Nos quatro dias em que ficamos por lá, pudemos presenciar alguns hábitos, costumes, tradições ainda caras aos italianos, como a celebração religiosa da Primeira Eucaristia, na igreja de San Vito, mártir, padroeiro de Polignano. A Igreja Católica Apostólica Romana tem sido a religião dominante na Itália há mais de 1.500 anos.

Em uma das praças, há uma imagem desse santo, provavelmente nascido na Sicília, cuja história está envolvida pela lenda. Filho de um pagão obstinado, aos 7 anos de idade era um cristão convicto e realizava prodígios de curas. Por sua fé, foi martirizado e morto em 15 de junho de 303 d. C. com apenas 15 anos.

Num outro momento, em uma pequena ruela, nos deparamos com uma senhorinha toda de preto. Ela nos chamou e contou em dialeto, que sua filha foi traduzindo, “che suo marito di oltre 60 anni è morto una settimana fa” e que o Zé Antônio lembrava muito ele. Pediu para abraçá-lo e beijá-lo. Nem é preciso dizer que a choradeira foi geral.

Na "Piazza Domenico Modugno", mio padre era di nuovo presente. Papai amava e escutava chorando esse cantor, um polignanesi, que ganhou o mundo cantando “Volare”, uma das mais conhecidas músicas italianas no mundo, lançada em 1958.

Além de explorarmos ao máximo Polignano a Mare nesses dias, visitamos algumas cidades da costa e do interior da Puglia, recheadas de ruínas greco-romanas e povoados milenares: Monopoli, Capitolo, Lecce, no salto da bota, Ostuni, linda, com sítios arqueológicos, muitos ainda a serem explorados, e Alberobello.

Foi com surpresa e alegria que encontrei em Ostuni, na Piazza Sant’Oronzo, a imagem de santo Oronzo (bispo), padroeiro da cidade, origine del nome del mio caro papà: Giuseppe Oronzo Centrone.

Em Alberobello, encontramos novamente San Vito, numa capela antiquíssima que primeiro recebeu sua imagem como santo protetor. Lá, conhecemos, e quase nos hospedamos em um dos “trulli” (plural de “trullo” gr. = “cúpula”), pequenas casas circulares com tetos e cúpulas cônicas, feitas em calcário, sem uso de qualquer argamassa, cimento ou rejunte, apenas pedras. Suas portas e paredes costumam ser brancas, decoradas com símbolos religiosos. Há várias explicações para a origem dessas casas que, atualmente, servem como moradia, hotel, lojas e restaurantes.

Por fim, já a caminho de Napoli, visitamos Matera, considerada uma das mais antigas cidades habitadas, com assentamentos humanos de mais de 10.000 anos atrás e organização social. Matera é famosa por seu centro histórico, conhecido como Sassi di Matera, Patrimônio Mundial da Unesco desde 1993. Os “sassi” (do latim “saxum“ = “colina” ou “grande pedra“) são cavernas esculpidas nas colinas rochosas, construídas umas sobre as outras, unidas por ruas sinuosas e escadarias íngremes, habitadas desde a Antiguidade. A Arianne e o Danilo visitaram uma igreja em uma dessas cavernas decorada com afrescos pagãos. Durante as duas Grandes Guerras, muitas famílias se refugiaram ali, o que confirmamos nas fotos penduradas nas paredes do restaurante em que almoçamos, adaptado em uma dessas sassi.

* * *

VOLARE - NEL BLU DIPINTO DI BLU
Penso che un sogno così non ritorni mai più
Mi dipingevo le mani e la faccia di blu
Poi d'improvviso venivo dal vento rapito
E incominciavo a volare nel cielo infinito

Volare oh, oh
Cantare oh, oh
Nel blu dipinto di blu
Felice di stare lassù
E volavo, volavo felice più in alto del sole
Ed ancora più su
Mentre il mondo pian piano spariva lontano laggiù
Una musica dolce suonava soltanto per me

Volare oh, oh
Cantare oh, oh
Nel blu dipinto di blu
Felice di stare lassù
Ma tutti i sogni nell'alba svaniscon perché
Quando tramonta la luna li porta con sé
Ma io continuo a sognare negli occhi tuoi belli
Che sono blu come un cielo trapunto di stelle

Volare oh, oh
Cantare oh, oh
Nel blu degli occhi tuoi blu
Felice di stare quaggiù
E continuo a volare felice più in alto del sole
Ed ancora più su
Mentre il mondo pian piano scompare negli occhi tuoi blu
La tua voce è una musica dolce che suona per me

Volare oh, oh
Cantare oh, oh
Nel blu degli occhi tuoi blu
Felice di stare quaggiù
Nel blu degli occhi tuoi blu
Felice di stare quaggiù
Con te

Texto e pesquisa: LIC 

Fonte: Maria Ana Centrone Santini

sábado, 5 de outubro de 2024

MEDITAÇÕES

@lic 

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Existem dias para as coisas mais improváveis, como o Dia do Tomate. 🍅

Mas, segundo o Marcus Aurelius (escrevi em latim porque ele tem homônimo até no futebol verde amarelo), hoje é um dia especial. "Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida", da minha vida, da nossa vida sobre este Planeta. Então, celebre-o com refeições saudáveis, convivências saudáveis, papos saudáveis, pensamentos saudáveis, atos saudáveis.

E leia os clássicos. 📚

sexta-feira, 4 de outubro de 2024

FRANCISCO DE ASSIS

@lic

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O Planeta não precisa de mais pessoas de sucesso. "O Planeta precisa desesperadamente de mais pacificadores", disse o Dalai Lama. Foi daí que lembrei que hoje é 4 de outubro, dia de Francisco, il poverello de Assis que saiu pelo mundo anunciando a paz. Seu slogan era PACE e BENE. Se depender de você, tenha paz com todos e, quando não depender, fique em paz com você mesmo. 

É isso pra hoje.

E leia os clássicos. 📚

quinta-feira, 3 de outubro de 2024

"FÉ EM DEUS E PÉ NA TÁBUA."

Tudo isso é bonito. Tudo isso é parte da minha vida.

Uma frase na rabeira do caminhão de feira estacionado na rua da minha casa me lembrou papai.

Papai colecionava frases de para-choque de caminhão. Guardava todas na sua memória prodigiosa que, entre outros registros, tinha indelevelmente gravados o número do telefone de seus irmãos, de seus filhos, de todos os seus queridos, talvez, até de alguns desafetos, que eram pouquíssimos.

“Fé em Deus e pé na tábua” era uma das suas preferidas.

Ele a repetia repetidas vezes pra meus irmãos, pra mamãe, pra mim, pra quem quer que lhe desse um minuto de atenção.

Homem de pouca cultura e leitura, acredito que essa frase sintetizava sua filosofia de vida: confiar na Providência divina, mas não esperar sentado por ela.

Meses depois de nascer, seu pai morreu. Era o ano 1926.

Com a mãe e quatro dos sete irmãos, veio do interior de São Paulo à procura de meios de sobrevivência. 

Vez ou outra, ele evocava lembranças pessoais, alguns momentos da sua vida.

Apreciava os das noites estreladas e refletia sobre aqueles das noites escuras vividas numa cidade onde sempre garoava. 

Desprendido de medos, temores, receios, se aventurou por caminhos seguros e outros nem tanto. 

Nessa trajetória, ganhou muitos amigos em quem confiava sem pedir notas promissórias.

Casou ousadamente, pois tinha amor e salário de bancário. Pra ele, só isso bastava. Acho que pra minha mãe também. Se bem que ela condicionou seu sim ao do seu pai.

Com a dupla aceitação, casaram no dia 1° do ano seguinte ao de um ano de 366 dias. "Casar em ano bissexto dá azar", sentenciara minha avó paterna.

Como filho, honrou sua mãe. Mais do que isso, ele a amou até seus últimos dias. Tenho certeza que para todo o sempre.

Foi pai sem autoridade, mas de cuidado amoroso. Não deixou que o pão de cada dia faltasse em nossa mesa.

Amou minha mãe nos seus 60 anos de convivência, não isentos de queixas e discussões. Por diversas vezes, pensei em lhes sugerir a separação. Mas eram tempos em que se acreditava piamente que, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, "o que Deus uniu, ninguém separe”.

Não nos encontramos face a face há 15 anos. Em sonhos, estivemos juntos por duas vezes. Numa delas, ele estava em casa à minha espera. "Você tem a chave", ele disse quando lhe pedi para abrir a porta.

Não entendi nem ainda a encontrei.

À noite, vasculho meus sonhos à procura de respostas. O Jung diz que podem estar lá.

Confio nos dois.

LIC